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20/Mar/2021 - 20:56:31
A igualdade, o dia da mulher e a pandemia
RedaçãoMARIA CAROLINA GERVÃSIO ANGELINI DE MARTINI
A Constituição Federal, em seu artigo 5º, preza pela igualdade entre todos, sem qualquer distinção de sexo e gênero. No âmbito infraconstitucional, a Lei Maria da Penha, nº 11.340/2006, buscou tutelar a mulher da violência sofrida, especificamente no âmbito doméstico, tendo em vista que, Maria da Penha, foi violentada pelo marido, levando um tiro enquanto dormia e, posteriormente, mantida em cárcere privado por 15 dias com tentativa de eletrocutá-la durante o banho. Assim, como o próprio sistema interno não foi "suficiente" para dar uma resposta a situação vivenciada, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos reconheceu a inércia do Brasil e fez recomendações, sendo certo que, mais adiante, a referida lei é criada, a fim de reconhecer a violação e a violência sofridas pelas mulheres e de buscar tutelá-las.
Em complemento a isto, tem-se a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher. A primeira requer as mesmas condições às mulheres, especificamente quanto a carreira, capacitação profissional, estudos, oportunidades, renda, liberdade, participação política e nas questões familiares. Já, a segunda, elucida o que seria a violência contra a mulher, colaciona os direitos das mulheres de serem protegidas, como o de ser livre da violência e da discriminação, o direito de ter seus direitos humanos e suas liberdades protegidas e exercidas, o direito à igualdade, o direito à liberdade e à dignidade.
Todavia, é notável que, mesmo com a previsão normativa, as desigualdades ainda são constantes, daí a necessidade da abordagem do assunto, especialmente em razão do dia 08.03, bem como pelo fato de que, com a pandemia da Covid-19, a vida de todos foi afetada, principalmente das mulheres.
A discrepância salarial, a ocupação de cargos mais altos por homens, a falta de previsão de ter se tornado mãe no currículo lattes de pesquisadoras, demonstram que a desigualdade persiste, além da dupla jornada por elas realizada. E, com a pandemia da Covid-19, as diferenças ficaram ainda mais evidentes, pois trabalhos que não permitem que sejam desempenhados em casa foram os mais atingidos, sendo certo que, na maioria, são realizados por mulheres, bem como a violência doméstica aumentou. Destaca-se que 95% do emprego doméstico é desempenhado por mulheres, o que as fez perder seus empregos, diminuindo a renda, ou serem ainda mais expostas ao vírus, por terem que sair de casa.
Em outras palavras, o acúmulo de funções pela mulher foi intensificado. Com a suspensão das aulas presenciais, a mulher não apenas vem desempenhando o papel de mãe, mas também auxilia no acesso às aulas e no próprio processo de aprendizado dos filhos, conciliando, ao mesmo tempo e se possível, a sua carreira Além do mais, o fato de não ter com quem deixar os filhos, fez com que a inserção da mulher no mercado de trabalho fosse diminuída, acarretando ainda mais numa situação de desigualdade quando comparada com a taxa de desocupação dos homens, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2020).
A respeito da violência doméstica, as notícias apontaram um crescimento neste período pandêmico, o que é ficou visível na véspera do dia das mulheres, em que foi divulgado que o país registrou cerca de 105 mil denúncias em 2020, o que representa cerca de 300 por dia. Enfatiza-se que destas, 72% é atinente a violência doméstica e intrafamiliar, segundo jornais como "Folha de São Paulo" e "O Globo".
Percebe-se, assim, a importância do Direito Internacional, haja vista o caso da Maria da Penha, mas, ao mesmo um tempo, um descompasso das situações para com os instrumentos legais, como a Constituição Federal, as Convenções e a Lei Maria da Penha. Afinal, muito embora prevejam e busquem a igualdade como um direito, ainda há muita luta para que ela seja plenamente realizada. E, mesmo se buscando a proteção da mulher e o fim da violência doméstica, ela, infelizmente, persiste, daí a necessidade de olharmos para as conquistas passadas e termos como base para as que ainda estão por vir, a fim de obtermos a igualdade material e formal. Também é preciso elucidar que as normativas protetivas fizeram e fazem diferença, mesmo que a violência e a desigualdade ainda sejam uma realidade.
Maria Carolina Gervásio Angelini de Martini, doutoranda UNICAMP, Profa. de Direito Internacional - PUC Minas e UNASP