São José do Rio Pardo, ,

10/Jul/2021 - 21:37:46

Gênero e Produção patológica

Redação

Gênero e Produção patológica




Na virada da ?poca Clássica (séc. XVII e séc. XVIII) para a Modernidade (séc. XIX) houve uma ruptura na construção dos saberes em relação ao louco e à loucura a partir da delimitação de doença mental pela psiquiatria. De acordo com o livro "Saúde mental, gênero e dispositivos: cultura e processo de subjetivação" de Zanello (2018), os loucos passaram a ser caracterizados como doentes mentais e foram colocados nos manicômios, tornando-se objetos de estudo de uma nova particularidade, a alienação mental. Assim, os sujeitos tiveram suas vozes anuladas e a loucura passou a ser caracterizada como a não razão. Isto posto, é de extrema importância refletir que, acima de tudo, a voz das mulheres foi a mais silenciada.

Isso se deve ao fato de que, ao longo dos séculos, foi atribuída aos homens a noção de   racionalidade e, à mulher a figura de louca e naturalmente fraca, trazendo a noção de algo intrínseco à sua subjetividade, isto é, de que as mulheres possuem maior tendência ao adoecimento mental.

Assim, a partir de uma noção reducionista da saúde mental feminina, explica-se a abundância de mulheres adoecidas psiquicamente e diagnosticadas com Histeria na Era Vitoriana. Com isso, é possível observar que o gênero é um significativo determinante social que deve ser considerado nos estudos acerca da saúde mental. Entretanto, nota-se que há uma escassez de ponderações realizadas sob esse ponto de vista.

Com o advento da patologia e psicopatologia e, principalmente, das Classificações Internacionais de Doenças e dos Manuais de Transtornos Mentais, houve um aumento na taxonomia, ou seja, um crescimento na classificação dos sujeitos que, consequentemente, trouxeram a noção da patologização da vida. Os indivíduos passaram a ser caracterizados pela ausência ou presença dos sintomas. A partir disso, evidencia-se que a especificação dos sintomas aponta limitações sob uma ótica de gênero. Isso ocorre em razão do gendramento dos sintomas, como o choro, por exemplo, que nos homens é socialmente reprimido e nas mulheres é autorizado e incitado. Como efeito, atualmente há um maior número de prescrição de psicotrópicos às mulheres devido a um hiper diagnóstico de Transtornos Mentais.

Portanto, sem uma crítica de gênero, produz-se um olhar errôneo que hiper diagnostifica certos grupos e inviabiliza os demais a partir do estabelecimento dos sintomas que constituem um transtorno. Isso é fruto de uma naturalização das diferenças definidas culturalmente entre homens e mulheres, que precisam ser contestadas.

Com isso, deve-se avaliar os valores e ideais dos próprios médicos acerca do que é gênero e também os padrões, muitas vezes acríticos e profundamente gendrados, utilizados para a interpretação dos sintomas, pois é através dos mesmos que são definidos o diagnóstico e a terapêutica.

Por fim, conforme Zanello (2018, p.29) "Não se trata de negar a biologia, mas de pensar em uma interface complexa entre mente, cérebro, corpo e cultura".

Referência:

ZANELLO, Valeska. Saúde mental, gênero e dispositivos: cultura e processo de subjetivação. 1. ed. Curitiba: Appris, 2018.


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