Um importante desafio imposto nas sociedades democráticas contemporâneas é fazer com que os cidadãos e cidadãs participem da construção de comunidades políticas, cuja característica seja a sobreposição do interesse coletivo aos interesses particulares. Inserida em uma sociedade pluralista, essas comunidades têm como objetivos debater e descobrir quais valores os diferentes grupos humanos compartilham e quais comporão o mínimo de justiça nessa sociedade sobre a qual serão alicerçados. Valores estes que devem ser colocados em debates, em fóruns próprios, tendo como premissa a tolerância e o respeito às diferenças. Dessa forma, as sociedades democráticas, para além de seus poderes institucionais clássicos, estabelecem ferramentas que possibilitam maior participação da sociedade civil no debate de políticas públicas em diferentes áreas de interesse e que afetam diretamente o nosso dia a dia.

Os princípios de justiça social estão preconizados em nossa Carta Magna, mas engajar os membros de uma comunidade em prol da democracia requer um equilíbrio entre esses princípios e um sentimento de pertencimento. A Constituição Federal de 1988 estabelece um rol de direitos, viabilizando o desenvolvimento de políticas públicas que atendam demandas de diferentes grupos da sociedade, já que, em seu artigo 5º, lê-se "todos são iguais perante a lei". Tal qual idealizado pelo legislador constituinte, o art. 5° concederia igualdade real a todos os cidadãos. Porém, o que ocorre é que essa tal igualdade sustenta discursos governamentais, mas carece de implementação; garante direitos, mas são interpretados conforme a porção hegemônica que está no poder. As consequências desse cenário é o estabelecimento de uma cultura que assimila e iguala a todos, em detrimento de uma outra, com princípios de alteridade e reconhecimento das diferenças. Nessa perspectiva, assume-se a defesa em sermos diferentes, mas que se reconheça as necessidades dos grupos que escapam do direito pensado à maioria ou aos que têm mais poder de decisão.

A Constituição Federal garante meios democráticos para esse debate e o exercício da cidadania, como os direitos a votar e ser votado, de liberdade de expressão, de filiação a partidos políticos e a entidades de classe. Como meio de efetivar maior participação popular, diversos mecanismos foram criados, sendo um deles, os conselhos municipais. Há diversos conselhos em um único município (de saúde, de educação, de segurança alimentar, de meio ambiente, de direito das crianças, de direito da mulher), sendo cada um deles criado para tratar de uma área de interesse público.

 São José do Rio Pardo já conta com vários conselhos municipais, mas nenhum voltado ao enfrentamento de uma cultura patriarcal e machista, cultura essa que fundamentou a construção da sociedade brasileira, até hoje, sujeitando a mulher ao poder masculino e caracterizando as desigualdades de gênero.

A criação de um espaço democrático para discussão das questões inerentes às opressões da vida pública e privada das mulheres é uma busca pelo exercício pleno de cidadania, para que elas tenham vozes para propor estratégias de combate a essas desigualdades e às diferentes formas de violência, tais como, assédio moral e sexual, discriminação, violência obstétrica, estupro, feminicídio.

O conselho municipal dos direitos da mulher é um mecanismo para unir forças da sociedade civil e governos para formulação, monitoramento e coordenação das políticas públicas que tenham como objeto a defesa dessa parcela da população. E, para que o objetivo da proposta seja atingido, o conselho deverá ser um espaço ocupado por mulheres que tenham interesse em múltiplas áreas e regido por princípios de justiça e equidade. Dessa forma, haverá a construção de um espaço em que o público feminino possa se sentir acolhido, desenvolvendo-se oportunidades para que todos os temas pertinentes sejam tratados com empenho e disposição.

Sofia Valeriano Silva Ratz é Integrante do Coletivo Feminista Todas Rio Pardo 

Coletivo Mulherio Rio Pardo