"A persistência da Constituição é a sobrevivência da Democracia"

Ulisses Guimarães

"Entendo que estejam chateados, mas calma, sou o chefe da nação". Esta frase foi dita pelo então Presidente Jair Bolsonaro, em uma de suas lives após o feriado de 7 de setembro.

Não raro nos deparamos com declarações de Jair Bolsonaro dizendo ser o "chefe da nação". Mas, afinal, ele é o chefe da nação?

Pois bem, para respondermos à questão é importante que nos atentemos para o conceito de "Nação". "Nação" tem um conceito sociológico e, atualmente, no âmbito político-constitucional, traduz um grupo humano conectado por laços comuns, raciais, religiosos, culturais e linguísticos. A finalidade da nação é conservar e transmitir o patrimônio cultural comum, e é esta finalidade que une seus membros. Assim, a nação é um todo composto pelas pessoas que possuem e transmitem a sua cultura, os nacionais.

Assim, podemos perceber que o "Chefe da Nação" seria aquele que tem autoridade de comando sobre todo um povo ligado por traços sanguíneos, étnicos, culturais, históricos, e tudo aquilo que forma uma nação. Portanto, pergunte-se: seria admissível, em um consolidado Estado democrático de direito, submeter cada um do povo às ordens de um único indivíduo? A resposta lógica é "não".

Alguns podem achar besteira, mas uma afirmação como a citada no início do texto, proferida por um presidente que sequer disfarça o desejo pelo controle de toda a sociedade brasileira, parece bastante preocupante.

O tema e o termo "Nação" são tão delicados que a própria Constituição Federal de 1988 evitou citá-lo ao longo de seus 250 artigos. Não é possível encontrar o termo "Nação" nela.

Pois bem, não há dúvidas de que alguém precisa colocar na cabeça do atual Presidente que ele não é, definitivamente, chefe da nação.

A Constituição de 1988 denomina o Presidente da República como Chefe do Poder Executivo, e apenas isso. Ora, se temos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e o Presidente da República é o Chefe apenas do Poder Executivo, parece óbvio que ele não pode se declarar "Chefe da Nação". Não existe Chefe da Nação!

Até mesmo o ilustre jurista Carlos Ayres Britto, ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, estudioso e conhecedor da Constituição, fez questão de ressaltar, nos últimos tempos, em várias passagens, que o Presidente da República é chefe de Estado e de Governo, mas jamais da Nação, e afirmou que a expressão "Chefe da Nação" é sim um perigo para a democracia.

Vê-se, portanto, que o atual Presidente nunca leu a Lei Maior do Brasil, muito menos a estudou, assim como os defensores dele também ou, se leram, ignoram totalmente os dizeres claros contidos nela.

Quem ainda defende e reverbera os dizeres inconstitucionais de Jair Bolsonaro, das duas, uma: ou fechou totalmente os olhos para a realidade do país e do povo (cada vez mais abandonados), ou realmente age com má-fé e desonestidade.

O fato é que Bolsonaro, exaustivamente, não é Chefe da Nação, e sequer exerce o papel que foi eleito para exercer que é o de Chefe de Governo. Pelo contrário, transformou o país em uma piada para o mundo e largado às traças pelo Governo Federal.

Isso precisa mudar! Crimes de responsabilidade capazes de embasar o impeachment do Presidente não faltam, mas parece muito difícil que isso ocorra. Por isso, não podemos, em 2022, cometer o mesmo erro que foi cometido em 2018.

Leiam a Constituição, estudem de forma séria a Lei Maior. Seria um ótimo começo para uma mudança de fato do país, para melhor.